Parafraseando Guimarães Rosa ao escrever: "Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. Eu posso dizer, não sei se foi este o dia, mas desconfio."
Amanheci, saí pelas ruas da capital, compras, vitrines, luzes, cores, encantos, e vem a hora do almoço. Entro no restaurante, escolho o prato e o garçom me alerta: olhe! Este é um prato para jovem! Desconsiderei a observação e mantive o pedido.
A tarde continuou vivaz e, de repente, encontrei um carro da Secretaria de Saúde fazendo Campanha de Vacinação. Automaticamente decidi, entrei na fila e fiz a vacina da gripe como diziam as pessoas ao redor. A vacinadora, bem simpática, enquanto preparava a seringa, me contou que estava muito feliz, pois na semana seguinte se formaria na faculdade. Quando se aproximou, perguntei se doía, e ela: "uma pessoa velha como a senhora nem sente".
Continuei meu giro e cheguei na loja de uma amiga. Ia entrando quando aparece o Matheus e sua mãe. Ela se dirige a mim e diz: "podes fazer o favor de ficar com ele aqui fora um pouquinho? Vou só pegar um presente". Aceitei, nos sentamos no banco da calçada e o papo correu solto em duas direções.
Na primeira, veio a cobrança do porquê eu não tinha ido ao seu aniversário de 6 anos com festinha na escola, pois era sua única convidada professora e ainda faltei. Expliquei-me, mas ele não se convenceu e disse que mesmo assim ia ler coisas na minha revista para me certificar que ele já sabia ler bem. Dito e feito, leu, interpretou e me explicou os encontros consonantais.
Depois de muito ler, nosso assunto foi na direção do seu Hoverboard novo e colorido. Eu não entendia como ele se equilibrava naquilo, mas ia e vinha correndo de um lado para outro. Lá pelas tantas me diz: "vamos fazer a volta na quadra enquanto minha mãe não vem?" Concordei, fizemos, voltamos, nos sentamos no banco, ele se aproxima, coloca uma mão de cada lado do meu rosto, me olha sorindo e diz: "Carmen, tu és a pessoa com cara de vó mais legal que eu conheço". Sorri. Sua mãe veio e ele se foi.
Continuei meu giro pensando no quanto meu inconsciente não reconhece minha velhice, e no como penso em mim criança ou jovem. Este é, de fato, um mecanismo que muitos de nós usa até nos depararmos com o espelho e com fotos que validam o presente de nossa existência.
Como disse Guimarães Rosa: "Também quase que nada não sei. Mas desconfio que aquele foi o dia em que eu me dei conta de que envelheci, pois tomei consciência de como o outro me vê".
Bem sabemos que a velhice começa na concepção, é a maior fase da vida e, com sorte, ficamos nela por 30, 40 ou mais anos.
Caro leitor, independente de sua idade, você está se preparando para esta longa fase da sua vida? Se deu conta que está envelhecendo? E como eu, já viveu alguma situação onde foi considerado pessoa velha?